Num dia frio, os manifestantes de todas as idades e géneros foram chegando ao inicio da tarde perto da Gare de l'Est, antes de começarem a andar e dançar até à Praça da Bastilha ao som de músicas feministas e tambores. E fizeram-se ouvir com gritos como "Paris antifascista" e "somos fortes, somos orgulhosas, somos feministas, somos radicais e estamos zangadas".
"Manifestamo-nos hoje para lutar contra a violência sexual, a violência de género e femicídios. É o único dia que temos para vir à rua e pedir um orçamento para lutar contra as violências (2,6 mil milhões de euros anuais)", disse à Lusa Maelle Noir, de 27 anos, do coletivo #NousToutes, uma das organizações que convocou a manifestação para assinalar o dia internacional contra a violência contra as mulheres e as minorias de género (25 de novembro).
Com roupas e acessórios roxos e cor-de-rosa e as caras com purpurinas, as mulheres foram acompanhadas por crianças e muitos homens, que seguravam cartazes como "condenar os agressores e os violadores", "1000 femicídios sob Macron #Estadoculpado".
Era o caso de Augustin, 32 anos, mas que defendeu que o Estado pode "invisibilizar o problema e dar meios à justiça" para permitir "penas mais justas" e que "as investigações possam ser levadas a cabo".
Com um toque de sirene e com um apelo para "parar com a cultura de violação" e exigindo uma lei para proteger mulheres e crianças, os manifestantes seguiram uma carrinha com altifalante até à praça da Bastilha, a cerca de três quilómetros, onde irão acontecer discursos e concertos até à noite.
Maelle Noir acredita que "não há uma diminuição das violências contra as mulheres" na França, mas espera que o julgamento do caso Pelicot, que começou em setembro e "chocou profundamente a sociedade francesa", tenha impacto numa mudança da sociedade francesa em relação às violências de género.
Desde 02 de setembro, tem decorrido num tribunal no sul da França, o julgamento das múltiplas violações a Gisèle Pelicot, de 71 anos, pelo seu agora ex-marido, Dominique, que a drogou por 10 anos para violar e entregar a, pelo menos, 50 homens identificados recrutados na Internet para a violarem.
"Hoje estou aqui com a Amnistia Internacional (AI) para defender o acesso à justiça de todas as mulheres que hoje são vítimas de violência sexual e hoje queremos iluminar, em particular, as mulheres migrantes, as mulheres trabalhadoras do sexo e trans, que são vítimas de violência sexual", disse à Lusa Lola Schumann, 39 anos, da AI francesa.
Para a representante da AI, "a questão da violência contra as mulheres aumenta hoje em dia, há mais e mais mulheres que dizem que sofreram de violência sexual e sexista".
Já Sybil, 30 anos, veio enquanto mulher "lutar pelos direitos do povo", ao considerar que a justiça francesa não faz o que é necessário ao julgar os casos de violações e que "está a ser bom a mediatização" do caso Pelicot não para a França, mas para todo o mundo.
"Acho que, sobretudo nesses momentos em que vimos vários casos de violência muito fortes, que este é um momento importante para se manifestar contra tudo isso", afirmou a manifestante Julia Torne, de 31 anos.
Louis Jeay, de 27 anos, trazia ao cartaz ao pescoço a frase "Acabar com o patriarcado", disse à Lusa sentir "vergonha de ser um homem", denunciando "a cultura de violência sistémica", com problemas na educação, a pornografia e as desigualdades no trabalho.
O percurso pelas ruas parisienses, acompanhado por dezenas de polícias a pé e por carrinhas que permitiram o bloqueio das ruas por horas, contou com milhares de cartazes roxos distribuídos pelo #NousToutes com frases como "Uma criança nunca consente", "Acesso à IVG (interrupção voluntária da gravidez) para todos", "Com queixa ou não, acredito em ti" e "A transfobia mata".
O coletivo, que convocou a mobilização em todas as cidades da França continental e do estrangeiro, denunciou que "desde que Emmanuel Macron [Presidente francês desde 2017] chegou ao poder" foram contabilizados mais de mil femicídios, exigindo a demissão do governo de Michel Barnier.
Mais de 50 manifestações estão previstas hoje por toda a França, promovidas por associações feministas, pelo partido de esquerda radical França Insubmissa (LFI) e pela Amnistia Internacional francesa.
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