Restrição a telemóveis na escola? "Que sirva de exemplo e sensibilização"

O Governo aprovou a proibição do uso de telemóveis nas escolas até ao 6.º ano de escolaridade e um uso com "limites" para o 3.º ciclo. O Notícias ao Minuto foi tentar perceber, junto da psicóloga Ivone Patrão, que impacto tem estas medidas.

Ivone Patrão

© Foto cedida por Ivone Patrão

Natacha Nunes Costa
04/07/2025 16:25 ‧ há 8 horas por Natacha Nunes Costa

País

Telemóveis

O Governo aprovou a proibição do uso de telemóveis nas escolas até ao 6.º ano de escolaridade, uma medida que vai entrar em vigor a partir do próximo ano letivo, ou seja, setembro.

 

A utilização no espaço escolar de equipamentos ou aparelhos eletrónicos com acesso à internet, como smartphones, está assim proibida a alunos do 1.º e 2.º ciclos do Ensino Básico, ou até aos 12 anos, "independentemente da natureza da instituição", ou seja, para público e privado.

Já para o 3.º ciclo, o uso deve ser "limitado".

A medida do Executivo, liderado por Luís Montenegro, foi tomada tendo em conta os resultados do estudo do Centro de Planeamento e de Avaliação de Políticas Públicas sobre as recomendações emitidas pelo Ministério da Educação, Ciência e Inovação, em setembro de 2024, relativas à utilização de smartphones nos recintos escolares.

Apesar do estudo ter revelado que as escolas que no ano passado optaram pela proibição de telemóveis registaram redução do bullying e indisciplina, nem todos parecem concordar com a decisão do Governo.

Alguns pais já se mostram insatisfeitos, garantindo que a medida vai gerar ansiedade, pelo facto do contacto com os filhos não ser tão automático.

Por outro lado, alguns diretores partilharam dificuldades na fiscalização e implementação das normas, sobretudo nas escolas onde coexistem diferentes níveis de ensino, e defenderam que a implementação deve ser feita de forma faseada e com uma fase de sensibilização.

Para perceber melhor esta decisão do Governo, o Notícias ao Minuto esteve à conversa com Ivone Patrão, psicóloga especialista em Saúde Mental e Bem-Estar Digital, que lançou recentemente o livro 'O que Podemos Fazer para Resgatar os Nossos Filhos dos Ecrãs'.

Para a especialista, a medida do Executivo "é muito bem-vinda" porque "coloca em cima da mesa uma questão muito importante: o uso dos ecrãs".

"Estávamos a jogar um jogo com a tecnologia sem regras e sem limites"

"O Governo ter tomado uma medida é algo desde já muito importante. Estávamos a jogar um jogo com a tecnologia - sem regras e sem limites nenhuns, porque não havia regulamentação. Neste último ano letivo, cada escola decidia por si e, antes disso, não havia qualquer indicação nem qualquer recomendação. Portanto, é muito positivo haver uma medida para todos que tem base científica. Há uma justificação, um argumento técnico-cientifico para aplicar algumas medidas de restrição de acordo com a idade, por causa não só da ciberdependência, mas também da cibersegurança. Há cada vez mais riscos online", realça Ivone Patrão, lembrando que para evitar estes perigos é necessário algumas competências e exemplo.

"Isto não é uma questão de controlo, de colocarmos as crianças sem desenvolverem a sua literacia digital, muito pelo contrário, é ajudá-las a desenvolver da melhor forma a sua literacia digital e o seu bem-estar digital, que agora tanto falamos. É que é mesmo muito importante. Ecrã na mão, mas em bem-estar, com segurança", salienta.

"Não pode haver uso de ecrãs sem regras nem limites"

Tal como escreve no seu livro, Ivone Patrão defende que "não pode haver uso de ecrãs sem regras nem limites". 

"É como um jogo de futebol. Sem regras e sem limites não tem graça nenhuma. Nem conseguimos jogar", compara, lembrando que "se estamos em sala de aula para estar em interação com o professor, não estamos a olhar para a tecnologia e se queremos crianças a socializar no intervalo, não podem estar todos os intervalos no telemóvel, porque senão não socializam".

Para Ivone Patrão não será difícil introduzir estas medidas na escola. Os casos mais desafiantes deverão ser aqueles em que as crianças já tinham acesso ao telemóvel e agora perdem-no. Mas nada que não se consiga com uma boa convesa.

"Será difícil gerir se as escolas não conversarem com os alunos e professores. Se houver uma boa parceria com os pais potenciamos qualquer medida que esteja a ser aplicada na escola. Tem de haver uma conversa clara e fundamentada. Da minha experiência, do contacto com os jovens, com crianças, quando lhes damos os argumentos, quando explicamos porque é que estamos a regular o uso do ecrã, eles percebem o que está em causa, que é o seu desenvolvimento, a sua saúde mental, a sua saúde física. Eles entendem. É necessário haver tempo e espaço adequado para o uso do ecrã, assim como também entendem que há regras para a nossa alimentação, para atravessar a estrada, o uso de uma bola numa escola", garante a profissional.

Além disso, as crianças "já estão habituadas, ao longo do seu desenvolvimento, a que haja crianças mais velhas, por exemplo, que já sabem ler [quando] elas ainda não sabem ler, que têm autonomia para ir para casa sozinhas e elas ainda não".

"E isso não tem de gerar frustração. É um olhar sobre a conquista da autonomia, um processo que se conquista com a idade, com a maturidade e com uma boa regulação do comportamento emocional", lembra Ivone Patrão, acrescentando que o "o que é muito importante para estabilidade de uma criança é que haja coerência entre os que estão à volta dele".

Telemóveis a tocar nas aulas com "mensagens dos pais"

Sobre a "ansiedade" de que alguns pais falam, pelo facto de não conseguirem saber se os filhos estão em segurança, a psicóloga recorda que as escolas têm os números dos educadores e que "quando acontece alguma coisa os pais são  informados".

Segundo diz Ivone, muitos professores têm reportado que há "miúdos com o telemóvel a tocar com telefonemas e mensagens dos pais em tempo letivo". "Isso não tem sentido. Nós queremos é que eles estejam concentrados, focados naquilo que é a sua aprendizagem. Não há necessidade de uma criança, que está em período letivo, estar a responder a mensagens dos pais. Não queremos crianças e jovens em 'multitasking'", nota.

Ivone não quer passar uma mensagem de culpabilização mas, "ao ritmo em que andamos, não pensamos que eles estão no tempo letivo e não passamos a melhor mensagem".

"Estamos a passar uma mensagem errada para essa criança e esse jovem. Só que estamos tão habituados a responder ao minuto que muitas vezes até nos esquecemos que o filho está em tempo letivo e esquecemos destas regras do bom senso", atira.

Por isso, Ivone Patrão está a favor das restrições aos telemóveis nas escolas e espera que "estas medidas sirvam de exemplo e de sensibilização para todos pararmos e para pensarmos". "A boa gestão do ecrã carece de aprendermos a gerir e, antes disso, temos de aprender a gerir as nossas emoções e comportamentos", conclui a psicóloga.

Leia Também: Governo aprova proibição do uso de telemóveis nas escolas até ao 6.º ano

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