Isto, apesar de o ex-ditador já não ser considerado por Paris como legítimo presidente do país quando foi emitido aquele mandato, o que torna nulo o princípio da imunidade pessoal.
Em novembro de 2023, juízes franceses emitiram um mandado de prisão por cumplicidade em crimes contra a humanidade e crimes de guerra contra Bashar al-Assad, pelos ataques químicos atribuídos ao seu regime em 2013, que mataram mais de mil pessoas.
Esse mandado foi contestado pela procuradoria antiterrorismo, com base na imunidade absoluta de que gozam os chefes de Estado em exercício perante os tribunais de países estrangeiros.
Mas o Tribunal de Apelação decidiu que esses crimes "não podem ser considerados como parte dos deveres oficiais de um Chefe de Estado" e validou o mandado de prisão em junho de 2024.
O Tribunal de Cassação, a mais alta instância da justiça francesa, reuniu-se hoje para decidir se há alguma exceção à imunidade pessoal de um chefe de Estado estrangeiro se este for suspeito de crimes de guerra ou crimes contra a humanidade.
E Rémy Heitz, procurador público do Tribunal de Cassação, anunciou hoje que "a imunidade pessoal foi consagrada" por uma decisão do Tribunal Internacional de Justiça em 2002, sem introduzir nenhuma exceção.
No entanto, Rémy Heitz propôs ao Tribunal "uma terceira via", que consiste em anular a imunidade pessoal de Bashar al-Assad, porque ele já não era considerado pela França como o "legítimo Chefe de Estado em exercício" quando o mandado de prisão foi emitido.
"Foram os crimes em massa cometidos pelas autoridades sírias que levaram a França a tomar essa decisão incomum" de "não reconhecer" a legitimidade de Bashar al-Assad em 2012, explicou.
Durante a audiência, foi levantada a necessidade de encontrar um equilíbrio entre a imunidade de um chefe de Estado, que garante a soberania dos Estados, e a luta contra a impunidade.
De acordo com Paul Mathonnet, o advogado que representa as partes civis - ONGs e vítimas - "devemos reservar o direito de anular essa imunidade pessoal caso a caso, se isso levar a uma situação de impunidade".
Ataques químicos, "que declaramos serem absolutamente proibidos, tendo em vista o sofrimento dos soldados nas trincheiras, em 1914-1918, o regime de Damasco praticou-os na população civil", lembrou Mathonnet.
O Tribunal Penal Internacional (ICC) não tem jurisdição sobre crimes internacionais cometidos na Síria, pois o país não ratificou o Tratado de Roma, que o criou. E nenhuma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas ordenou o seu encaminhamento.
O contexto geopolítico mudou desde que o mandado de prisão foi emitido: Bashar al-Assad foi derrubado em dezembro e agora é um refugiado.
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